O delegado Orlando Zaccone diz que a indecisão de seus colegas entre a carreira policial e a carreira judiciária enfraquece a Polícia Civil.
Orlando Zaccone. "Os delegados não sabem se estão ligados ao mundo jurídico ou ao mundo policial"
REDAÇÃO
Orlando Zaccone, 50, é delegado da Polícia Civil desde 1999. Atualmente está lotado na 30° DP (Marechal Hermes). É conhecido por ser um intransigente defensor dos Direitos Humanos e do fim da Guerras às Drogas. Nesta entrevista, ele trata de outro tema polêmico. Para o delegado, seus colegas devem se decidir entre a carreira policial e a judiciária. “Os delegados não podem ficar nessa zona de conforto: reivindicam a sua carreira como jurídica, mas querem comandar a polícia sem pertencerem a carreira policial”, argumenta Zaccone
.
Qual é a importância do delegado na polícia hoje?
Esta não é uma pergunta que pode ser respondida de forma simples. Hoje os delegados não sabem se estão ligados ao mundo jurídico ou ao mundo policial. A indecisão tem origem legal. Ora os delegados são tratados como policiais, como é o caso da lei da aposentadoria compulsória aos 65 anos de idade. E, em outros casos, como no artigo 3° da lei n° 12.830, é indicado que o tratamento protocolar que deve ser dado aos delegados é o da carreira jurídica. Mas se nós não decidirmos se somos vinculados ao mundo jurídico ou se somos policiais, quem sai enfraquecida dessa indecisão é a Polícia Civil.
Como essa indecisão afeta a instituição?
Os delegados, muitas vezes, utilizam-se dessa indecisão para agir segundo os seus interesses corporativos. Se vinculam ao mundo jurídico quando estão discutindo a questão salarial, reivindicando um salário equivalente ao de juiz, por exemplo. Mas, ao mesmo tempo, quando se trata da posição de comando da polícia, não abrem mão dessa função. Os delegados devem se definir se são juristas ou policiais.
Quais seriam os desdobramentos para a Polícia Civil; caso os delegados optassem definitivamente pelo carreira jurídica, ou pela carreira policial?
Se decidirmos nos integrar ao mundo jurídico, o delegado deve realizar a contenção do poder punitivo, atuando como uma espécie de juiz de instrução. Neste caso, obviamente, seria justa a reivindicação dos nossos salários, benefícios e prerrogativas serem equivalentes à dos juízes e promotores. Por outro lado, se a decisão for de nos integrarmos definitivamente ao mundo policial; teremos que lutar por um sindicato único, abrir mão de nos compararmos ao mundo jurídico e exigirmos a melhoria dos salários da carreira policial. Em outras palavras, salários de agentes e delegados regidos pela proporcionalidade. Mas a tática do sindicato único não vai vingar, se na hora da discussão de salário não há unidade. Não adianta eu ser filiado ao Sindpol, como sou, se enxergamos delegado e agente como carreiras de naturezas diferentes. Eu acho que essa é a questão que delegados e agentes devem discutir hoje.
Para que serve o cargo de delegado de polícia?
Se o delegado passa a não ter mais atribuições jurídicas, como fica a exigência do diploma de Direito?
Não existiria essa necessidade. Ou somos juristas e nos transformamos em uma espécie de juiz de instrução, ou prescindimos do diploma jurídico e fazemos parte da carreira policial. Como, por exemplo, é o caso argentino. Lá o comissário é o cargo máximo da polícia e o controle da atividade policial é feita pelo judiciário. Tanto que alguns juízes, aqui posso citar o Eugenio Zaffaroni, defendem que o único agente de justiça criminal que pode fazer contenção de poder punitivo é o juiz. Já no Brasil o delegado pode fazer essa contenção. Os delegados não podem ficar nessa zona de conforto: reivindicam a sua carreira como jurídica, mas querem comandar a polícia sem pertencerem a carreira policial. Isso é o mundo de Deus sem Deus!
Fonte:
http://colpol.com.br/a7/?p=1258
Nenhum comentário:
Postar um comentário